A
Paixão de Joana d'Ark (La Passion de Jeanne d'Arc)
Direção:
Carl Theodor Dreyer
Roteiro:
Carl Theodor Dreyer, Joseph Delteil
Duração:
82 minutos
Ano: 1928
País:
França
Sinopse: França, século XV, Joana de Domrémy, filha do povo, resiste bravamente a ocupação de seu país. É presa, humilhada, torturada e interrogada de maneira impiedosa por um tribunal eclesiástico, que a levou, involuntariamente, a blasfemar. É colocada na fogueira e morre por Deus e pela França.
A renomada e altamente respeitada crítica de cinema, Pauline Kael, certa vez disse que a interpretação de Maria Falconetti como Joana
d'Ark é a melhor interpretação já filmada em todos os tempos. Isso me deixou
bastante curioso. Eu queria ver com meus próprios olhos. E, já
posso dizer que com certeza é a interpretação mais intensa que eu
já vi. Justamente pelo fato de ser quase que cem por cento uma
interpretação de expressões faciais e olhares. O filme é mudo. Maria
Falconetti, atriz de teatro, usou tudo o que tinha e o que não tinha
para trazer à vida Joana d'Ark. E talvez ela seja a pessoa mais
expressiva ever.
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Joana d'Ark no início do filme |
O diretor Carl Theodor Dreyer tinha uma visão estética única. Os
movimentos de câmera são inovadores. E são vários movimentos, em
todos os eixos e em todos os ângulos. A grande maioria dos planos
são extremos close-ups dos rostos dos atores. Principalmente do rosto de
Falconetti. Além disso, Carl não permitiu que nenhum ator
utilizasse qualquer tipo de maquiagem, justamente para que os
detalhes de cada face fossem visíveis nos closes.
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Em um momento, Joana leva uma cusparada no rosto |
O filme mostra o julgamento, as torturas e a execução de Joana
d'Ark. E é interessante ver como era a mentalidade das pessoas na
época de Joana. O fato de ela usar roupas de homem incomodava, e
muito, aos ditos sábios. E para julgá-la, usavam de perguntas
extremamente tendenciosas, com o objetivo de fazê-la blasfemar. Joana respondia como podia. Ela não era
uma pessoa culta e letrada como os homens que a subjugavam. Ela era
uma pessoa simples movida pela fé e por seu amor a Deus. E podemos
perceber isso na profundeza do olhar de Falconetti. Essas cenas
lembram muito as passagens bíblicas em que Jesus é julgado,
torturado e executado. Temos até a zombaria na qual colocam em Joana
uma coroa (não de espinhos) e a chamam de “Filha de Deus”. Devo
ressaltar que um dos meus filmes preferidos, Jesus de Nazaré (Jesus
Of Nazareth) de 1977, teve cenas inspiradas por A Paixão de Joana
d'Ark. A forma como Jesus encara os fariseus no filme, com seu olhar
distante e a cabeça levemente inclinada, juntamente com a maneira que
é filmado é muito semelhante ao filme de Carl Dreyer. E, tanto
Jesus quanto Joana tiveram seu momento de dúvida e medo retratados de forma belíssima.
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Joana é zombada com uma coroa e uma flecha |
O cineasta francês Jean-Luc Godard faz uma linda referência ao
filme de Dreyer em seu Viver a Vida (Vivre Sa Vie) de 1962. A
personagem Nana, interpretada pela sempre ótima Anna Karina, chora ao
assistir A Paixão de Joana d'Ark no cinema. E, nessa cena, Godard
filma Anna Karina exatamente da mesma forma que Dreyer filmou Maria
Falconetti, chegando a colocar as duas em comparação.
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Joana no local onde foi executada |
A versão original de A Paixão de Joana d'Ark esteve, por muito
anos, perdida. Só foi encontrada em 1981 em um sanatório para
doentes mentais em Oslo, na Noruega. Agora, após assisti-lo, fico
muito feliz que tenha sido encontrado. É um filme profundo, de uma
interpretação transcendental e de extrema delicadeza emocional.
Maria Falconetti é a prova de que interpretação é algo que vem da
alma, da entrega do ator e da sensibilidade do olhar.
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A beleza e a intensidade de uma lágrima |
Mais uma coisa: o nome verdadeiro de Maria Falconetti era Renee
Jeanne Falconetti. Joana d'Ark em francês é Jeanne d'Arc.
Resenha de Raphael Chiavegati Oliveira.
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