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quarta-feira, 17 de maio de 2017

Resenha: Estranho Encontro (1958)


Estranho Encontro

Direção: Walter Hugo Khouri
Roteiro: Walter Hugo Khouri
Duração: 89 minutos
Ano: 1958
País: Brasil

          Sinopse: Ao dirigir-se para a casa de campo de sua noiva, um rapaz vê na estrada uma moça cambaleando e resolve ajudá-la. Ele a leva consigo e ela diz que estava fugindo de seu companheiro que a maltratava.

          Já faz mais de três anos que não escrevo para este blog. Eu precisava de um bom motivo para voltar a escrever aqui. Eis que me surge esse filme que acabo de assistir. E o melhor ainda: um filme nacional. Que produção primorosa! Fui maravilhosamente surpreendido meio que aleatoriamente. Sim, pois escolhi uma playlist random de filmes nacionais antigos e esse era o primeiro da lista. E já nos primeiros minutos de projeção eu estava envolvido com a trama.
A bela Andrea Bayard no banco de passageiro do carro de Marcos
          Pode-se dizer que o clima do enredo é envolto de mistério. O filme já começa com Marcos dirigindo por uma estrada a noite. Ele é surpreendido por uma linda moça perdida no meio da estrada. Na verdade ele quase atropela a coitada. Após a freada brusca ele sai do carro para tentar ajudá-la e ela parece bastante confusa. Tudo o que ela quer é fugir. Marcos que estava a caminho da casa de sua companheira resolve levar a moça. Nesse ponto chegou a me lembrar do excelente 5 Steps to Danger (1957) de Henry S. Kesler. Recomendo!
Justaposição de um relógio sobre o rosto de Júlia. Seu companheiro era obcecado por relógios.
          Chegando lá, o caseiro estava presente no local, para o azar de Marcos. O rapaz decide esconder a moça do caseiro, a fim de evitar problemas com sua companheira. E devo dizer que até aqui eu já estava vidrado no filme. O roteiro é muito bem escrito e a direção é quase impecável. A cada diálogo queremos saber mais e mais sobre as personagens.
Marcos e Júlia
          Uma vez dentro da casa e escondidos do caseiro, a moça, que se chama Júlia, explica para Marcos o motivo de sua fuga. Ela diz que foge de seu companheiro por ele maltratá-la. Nesse momento entramos em um flash-back sensacional que mostra a relação dela com Hugo, que é um homem atormentado e neurótico que tem uma perna amputada. E as cenas são cheias de estilo e têm toques de surrealismo. E é bom observar que Hugo aparece sempre de costas, mantendo o mistério em torno de sua figura e deixando-o mais ameaçador.
Júlia e Hugo. Repare que Hugo não aparece de rosto. E repare também como a presença dele oprime Júlia na cena.
          Conversa vai, conversa vem, Júlia acaba passando a noite lá. Mais do que isso, passa duas noites. O grande problema foi que na manhã do terceiro dia a companheira de Marcos, Wanda, chega. Wanda é uma mulher um pouco mais velha e rica que sustenta o rapaz e faz tudo o que ele quer. E as coisas ficam complicadas quando Marcos vê que Hugo colocou um anúncio no jornal sobre o desaparecimento de Júlia alegando que ela sofre de suas "faculdades mentais". Vou parar por aqui de falar sobre o enredo, pois não quero estragar nada.
Um close-up extremo de um gato.
          Me impressionei com as duas atrizes, a ótima Andrea Bayard que interpreta a Júlia e a igualmente talentosa Lola Brah que interpreta a Wanda. Elas têm uma presença de cena e lembram muito atrizes clássicas de Hollywood. Elas têm tanto carisma quanto. Mário Sérgio que interpreta Marcos também impressiona. Ele faz bem o tipo "cara sacana de bom coração". Luigi Picchi, mesmo de costas na maior parte do tempo, entrega um Hugo carrancudo e ameaçador. E não vou deixar de citar o ótimo Sérgio Hingst que faz bem o papel do caseiro filho da puta mercenário que é um X9 Rui. Todos convencem muito bem. Na verdade o filme todo possui uma elegância que me surpreendeu demais e que vai me fazer assistir a mais filmes nacionais dessa época.
Olha que lindo esse plano!
          O final me deixou surpreso também. Não por ser algo ultra bombástico, mas por ser bem humano. Sério! Se você assistir vai entender o que eu estou falando. O que é um final feliz para uns, é um final trágico para outros. O espectador consegue sentir a alegria e ao mesmo tempo a melancolia com o desfecho da trama. Fica aí a dica de filme bom desconhecido nacional dos anos 50 que você estava procurando.

Resenha de Raphael Chiavegati Oliveira

O filme está disponível no Youtube. Assista aqui: 



terça-feira, 12 de novembro de 2013

Resenha: Paixões Que Alucinam (1963)


Paixões Que Alucinam (Shock Corridor)

Direção: Samuel Fuller
Roteiro: Samuel Fuller
Duração: 101 minutos
Ano: 1963
País: Estados Unidos

      Sinopse: Um jornalista ambicioso se compromete a resolver um assassinato cometido dentro de um asilo - o que ele considera uma grande chance para conquistar o Prêmio Pulitzer Para isso, ele precisa infiltrar-se entre os pacientes, sendo internado como louco dentro da instituição. Só que o convívio com os outros pacientes, e com a rotina do sanatório, provocarão dramáticas mudanças no presunçoso repórter.

      Já dizia o Coringa: “A loucura é como a gravidade, basta um empurrãozinho!” Essa frase podia até ser uma epígrafe para este filme de Sam Fuller. Cairia como uma luva. Mas, o filme começa com outra epígrafe, igualmente genial. Uma frase do poeta trágico grego Eurípedes: "A quem Deus quer destruir, primeiro o enlouquece." Ou seja, o filme já começa nos dando um soco na boca do estômago, e nos dará vários deles ao longo da projeção. O título original do filme Shock Corridor fala muito mais do que o título em português, pois, o corredor pode ser considerado como um personagem. Eu estou tentando entender de onde tiraram o título Paixões Que Alucinam...
Johnny Barret no meio do "corredor"
      O jornalista Johnny Barrett almeja subir em sua carreira e ganhar o Prêmio Pulitzer. Uma forma que ele encontrou de fazer isso é se passando por louco em um sanatório para tentar descobrir quem assassinou um dos pacientes. Seria a matéria do ano. Para isso, juntamente com seu chefe, ele usa sua namorada Cathy no esquema. Ela se passa por sua irmã e vai denunciá-lo por atos de incesto, de modo que o levem internado. Ele passa por toda uma preparação com um psiquiatra para agir exatamente como um louco. Obviamente, Cathy é contra isso, mas acaba cedendo. Aí é que começa o drama. Aos poucos vemos como um ser humano “são” e torna louco. Nesse ponto o filme é impecável. Eu realmente me senti perturbado. Imagina que tenso...
Cathy e Johnny
      Porém, não só de socos no estômago é feito o filme. Temos momentos realmente divertidos. Meu personagem favorito é disparado o Pagliacci. Quem assistiu vai entender perfeitamente. De início até tive medo dele. Mas, aos poucos se revelou bastante engraçado e cativante. Imagina um cara alto, gordo, que dorme em uma cama ao lado da sua. Essa pessoa se levanta no meio da noite e começa a cantar ópera olhando pra você. Este é o Pagliacci. Além dele, tem outros personagens bastante irônicos, como um negro que acredita que é o grão mestre da Ku Klux Klan, por exemplo.
Pagliacci, gente boa pra caramba
      Sam Fuller filma de forma crua. O filme é como um vômito da mente humana. É assustador como é fácil deixar uma pessoa com a sanidade mental comprometida. E o interessante é que essas pessoas têm alguns rápidos momentos de sanidade. É aí que Johnny tem que agir, pois sabe-se que três pacientes presenciaram a cena do crime. Aos poucos Johnny interage com as testemunhas coletando as informações necessárias. E algo que achei bastante genial foi o modo como os pacientes tinham seu momento de sanidade. A fotografia do filme é em preto & branco de alto contraste. Mas, nesses momentos, quando o paciente se lembra de algo real de sua vida, as lembranças se tornam coloridas.
Essa cena não precisa de legenda...
      Tudo isso é uma grande crítica ao ser humano. Até que ponto um homem chega para ganhar um prêmio? Que riscos uma pessoa se submete para isso? No final vale à pena? Sam Fuller nos mostra que o ser humano é capaz de qualquer coisa para obter sucesso. Nos mostra que o mundo é um lugar fútil (vide os vídeos mais acessados da internet). E, assim como o Coringa, nos mostra que para a loucura, basta um empurrãozinho. Ou basta uma visitinha ao corredor...


Resenha de Raphael Chiavegati Oliveira

sexta-feira, 25 de outubro de 2013

Resenha: Pauline na Praia (1983)


 Pauline na Praia (Pauline à la Plage)

Direção: Eric Rohmer
Roteiro: Eric Rohmer
Duração: 94 minutos
Ano: 1983
País: França


      Sinopse: Pauline (Amanda Langlet) tem 15 anos e vai passar as férias de outono com Marion (Arielle Dombasle), sua prima mais velha. Elas vão para a costa francesa do Atlântico, onde Marion reencontra um velho amigo, Pierre (Pascal Greggory). Apesar do interesse dele, Marion prefere ficar com o aventureiro Henri (Féodor Atkine), apesar de saber que o relacionamento deles não tem futuro. Paralelamente, Pauline mantém um romance com o adolescente Sylvain (Simon de la Brosse). Até que Henri decide usar Sylvain para se livrar de um problema que teve com Marion, o que atrapalha seu namoro com Pauline.


     Eric Rohmer é um ótimo diretor de atores. Vemos isso pela maneira orgânica em que os diálogos se desenvolvem nas cenas. Cada diálogo, cada olhar, cada gesto, tudo é retratado de forma bastante natural. E isso é fundamental em um filme como Pauline na Praia, que trata de relações entre as pessoas. O filme me chamou bastante atenção nesse ponto. Eu estava realmente interessado nos rumos que as relações entre as personagens ia tomar. E isso se deve, claro, entre vários fatores, ao excelente roteiro de Rohmer. Todas as situações vão se desenrolando em cadeia, até que algo seja resolvido e se crie outra situação.
Pierre, Pauline, Marion e Henri
     Pauline vai passar as férias com sua prima mais velha Marion. Lá, em uma ida à praia, Marion encontra Pierre, que é um friendzone antigo amigo que há tempos não via. Logo, ele se mostra apaixonado por Marion, que, obviamente, não está nem um pouco interessada. E, por intermédio do destino, Marion conhece Henri, que é um bon vivant. Na hora, ela sente uma atração por ele, o que emputece Pierre, que sabe que Henri é um comedor aproveitador.
Sylvain e Pauline
      Um dos pontos altos do filme são os diálogos das personagens sobre relações amorosas. Marion, que acredita ser mais experiente nesse assunto tenta dar conselhos amorosos à Pauline, que, apesar de ser uma garota de 15 anos de idade, mostra ser bem mais madura do que ela. Pauline conhece o garoto Sylvain, que é um par romântico bem mais confiável do que Henri. Pelo menos nesse ponto, a garota é bem mais esperta que sua prima mais velha. Ah, e detalhe, podemos ver que Henri não é lá um sujeito muito responsável logo no início, quando deixa sua filha pequena dormindo sozinha em casa à noite pra ir na balada com pessoas que acabou de conhecer.
Pierre tentando conquistar Marion
     Mas, não se engane! Não tem nenhum tipo de maniqueísmo no filme. Apesar de ser um cara “esperto”, Henri demonstra se preocupar com Marion em alguns momentos. E o filme não mostra só a fraqueza de Marion ao se apaixonar pelo clássico cafajeste, como também mostra o outro lado. Pierre, que a amava de verdade, não era um par interessante. A própria Pauline diz algo parecido ao rapaz em determinado momento. Ele não se esforça para conquistar Marion. Se limita apenas a implorar pelo amor da moça. Não sei se é apenas uma viagem minha, mas, pelo menos de início, me pareceu que Marion se aproximou de Henri só para se livrar do insistente Pierre.
Pauline e Marion
     Não posso deixar de falar de Pauline, que é uma personagem cativante. Ela representa muito bem o espírito adolescente de questionar tudo e de querer fazer tudo à sua maneira. A atriz Amanda Langlet deu um show aqui. Todas as cenas dela são muito boas. É daquele tipo de personagem que queremos saber realmente a opinião. Queremos saber o que se passa por sua cabeça. Além disso, temos um toque de Lolita nela. A garota aparece em algumas cenas sensuais/ inocentes, de modo que chega até a despertar o interesse de um dos adultos. Mas, é claro, não vou dar spoiler... sou mestre nessa arte milenar e subliminar.
Pauline
     Pauline na Praia mostra que é fácil cometermos erros quando gostamos de alguém. Ficamos cegos como Marion, à ponto de não percebermos tudo o que nos envolve naquele momento. Ou até sabemos, mas fingimos não saber, e acabamos nos deixando enganar. Eric Rohmer fez aqui um trabalho brilhante ao pegar uma trama simples e expandi-la em relações complexas, mantendo a direção segura, a montagem invisível e os atores bem à vontade. E o elenco foi muito bem escolhido.


Resenha de Raphael Chiavegati Oliveira.

sábado, 19 de outubro de 2013

Tirinha 3 - Pornografia


Algum cara vai ter os testículos esmagados...
 
... em câmera lenta.
 
Mas só se ele tiver sorte.

sexta-feira, 18 de outubro de 2013

Tirinha 2 - Playstation 4


Pois é, Christine.
 
Não vai ser dessa vez...
 
Mas, relaxa. Acabou de lançar o GTA V pro Play 3.

quarta-feira, 9 de outubro de 2013

Tirinha 1 - Greve Na USP


Pois é, Tuco. Vai entender...

Eu acho que eles querem tirar umas férias.

Aliás, eu também quero tirar umas férias...

domingo, 6 de outubro de 2013

Resenha: A Paixão de Joana d'Ark (1928)


A Paixão de Joana d'Ark (La Passion de Jeanne d'Arc)

Direção: Carl Theodor Dreyer
Roteiro: Carl Theodor Dreyer, Joseph Delteil
Duração: 82 minutos
Ano: 1928
País: França

   Sinopse: França, século XV, Joana de Domrémy, filha do povo, resiste bravamente a ocupação de seu país. É presa, humilhada, torturada e interrogada de maneira impiedosa por um tribunal eclesiástico, que a levou, involuntariamente, a blasfemar. É colocada na fogueira e morre por Deus e pela França.

   A renomada e altamente respeitada crítica de cinema, Pauline Kael, certa vez disse que a interpretação de Maria Falconetti como Joana d'Ark é a melhor interpretação já filmada em todos os tempos. Isso me deixou bastante curioso. Eu queria ver com meus próprios olhos. E, já posso dizer que com certeza é a interpretação mais intensa que eu já vi. Justamente pelo fato de ser quase que cem por cento uma interpretação de expressões faciais e olhares. O filme é mudo. Maria Falconetti, atriz de teatro, usou tudo o que tinha e o que não tinha para trazer à vida Joana d'Ark. E talvez ela seja a pessoa mais expressiva ever.

Joana d'Ark no início do filme
   O diretor Carl Theodor Dreyer tinha uma visão estética única. Os movimentos de câmera são inovadores. E são vários movimentos, em todos os eixos e em todos os ângulos. A grande maioria dos planos são extremos close-ups dos rostos dos atores. Principalmente do rosto de Falconetti. Além disso, Carl não permitiu que nenhum ator utilizasse qualquer tipo de maquiagem, justamente para que os detalhes de cada face fossem visíveis nos closes.

Em um momento, Joana leva uma cusparada no rosto
   O filme mostra o julgamento, as torturas e a execução de Joana d'Ark. E é interessante ver como era a mentalidade das pessoas na época de Joana. O fato de ela usar roupas de homem incomodava, e muito, aos ditos sábios. E para julgá-la, usavam de perguntas extremamente tendenciosas, com o objetivo de fazê-la blasfemar. Joana respondia como podia. Ela não era uma pessoa culta e letrada como os homens que a subjugavam. Ela era uma pessoa simples movida pela fé e por seu amor a Deus. E podemos perceber isso na profundeza do olhar de Falconetti. Essas cenas lembram muito as passagens bíblicas em que Jesus é julgado, torturado e executado. Temos até a zombaria na qual colocam em Joana uma coroa (não de espinhos) e a chamam de “Filha de Deus”. Devo ressaltar que um dos meus filmes preferidos, Jesus de Nazaré (Jesus Of Nazareth) de 1977, teve cenas inspiradas por A Paixão de Joana d'Ark. A forma como Jesus encara os fariseus no filme, com seu olhar distante e a cabeça levemente inclinada, juntamente com a maneira que é filmado é muito semelhante ao filme de Carl Dreyer. E, tanto Jesus quanto Joana tiveram seu momento de dúvida e medo retratados de forma belíssima.

Joana é zombada com uma coroa e uma flecha
   O cineasta francês Jean-Luc Godard faz uma linda referência ao filme de Dreyer em seu Viver a Vida (Vivre Sa Vie) de 1962. A personagem Nana, interpretada pela sempre ótima Anna Karina, chora ao assistir A Paixão de Joana d'Ark no cinema. E, nessa cena, Godard filma Anna Karina exatamente da mesma forma que Dreyer filmou Maria Falconetti, chegando a colocar as duas em comparação.

Joana no local onde foi executada
   A versão original de A Paixão de Joana d'Ark esteve, por muito anos, perdida. Só foi encontrada em 1981 em um sanatório para doentes mentais em Oslo, na Noruega. Agora, após assisti-lo, fico muito feliz que tenha sido encontrado. É um filme profundo, de uma interpretação transcendental e de extrema delicadeza emocional. Maria Falconetti é a prova de que interpretação é algo que vem da alma, da entrega do ator e da sensibilidade do olhar.

A beleza e a intensidade de uma lágrima
Mais uma coisa: o nome verdadeiro de Maria Falconetti era Renee Jeanne Falconetti. Joana d'Ark em francês é Jeanne d'Arc.



Resenha de Raphael Chiavegati Oliveira.